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quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

MORRE A PROFESSORA MADÁ PATRIOTA, EX-PRIMEIRA DAMA DE ITAPETIM

Grupo Escolar D. José Lopes, Professora Maria Madalena Guedes Patriota
Década de 1950
Eu gosto de reviver o passado. Eu gosto de deixar para meus netos como foi viver numa vilazinha do interior chamada Umburanas, lá no meu Sertão do Pajeú, no tempo em que só tínhamos acesso à escola aos sete anos de idade. Antes disso, tudo que sabíamos era através da oralidade dos nossos pais e avós, não tínhamos televisão, não dispúnhamos de jornais ou revistas, a cominicação com o mundo se restringia à escuta de um velho rádio que, na falta da energia elétrica, era alimentado por uma bateria.
Bernadete (Beta), minha irmã,  é mais velha do que eu quase três anos. Ela já freqüentava a escola desde 1954, ano em que eu tinha apenas 5 anos de idade.

Ao vê-la sair de casa, vestida de azul e branco, carregando uma bolsa de livros, rumo à escola, eu não me conformava com aquela situação. Eu chorava todas as vezes que a via saindo para o Grupo Escolar D. José Lopes, que por sinal ficava defronte a nossa casa. Uma das professoras era Dona Madá, a tão temida Dona Madá, pela sua exigência ao cumprimento do dever, à assiduidade, à tarefa feita com zelo, ao comportamento exemplar e ao aprendizado propriamente dito, daquilo que ensinava com tanta competência.

Sentindo-me injustiçada, convenci meus pais a comprarem para mim um uniforme escolar e os mesmos livros que compraram para minha irmã no início daquele ano letivo de 1956.

Naquele ano eu tinha apenas seis anos de idade,  por isso não tinha ainda o direito de matricular-me. Mas de tanto fazer confusão na hora da saída da minha irmã mais velha para a escola, meus pais resolveram atender aos meus apelos.

E assim, naquele memorável dia de volta às aulas, entre os veteranos, eu estreava o meu uniforme novo e saía de casa, segurando a mão do meu pai, em direção à escola, juntamente com minha irmã que já estava devidamente matriculada. Agora, sim, eu era igual a minha irmã, pensava comigo mesma: "Já sou grande, não sou mais aquela menina pequena que minha irmã esnobava quando se vestia para ir à escola".

Lourinha, de olhos verdes, vestida de azul e branco, carregando uma bolsa cheia de livros, não cabia em mim tanta alegria e emoção.



Ao chegarmos no Grupo Escolar D. José Lopes, meu pai se dirigiu a Dona Madá, a professora da minha irmã,  para explicar a minha presença e, encarecidamente, pedir-lhe que me deixasse permanecer na sua sala de aula, independentemente de ter sido matriculada naquela instituição.

Um pouco receiosa - com certeza temendo que eu pudesse perturbar as suas aulas - aceitar-me-ia, mas com uma condição: se o meu comportamento não fosse condizente com as normas da casa, ela me devolveria sem pestanejar. Ao que meu pai, de pronto, concordou com ela.

Eu era uma garota muito sapeca, mas não ousava desafiar as ordens dadas, pois sabia que se isso acontecesse teria que enfrentar os meus pais, e a volta da minha casa era muito dura quando eles tinham conhecimento de que teríamos faltado com os nossos deveres e obrigações, o castigo era por demais severo.

E foi assim que recebi os meus primeiros conhecimentos advindos dos bancos escolares de uma escola estadual, antes já havia estudado nas escolas paroquiais e particulares, mas sem uniforme, na companhia de poucos garotos e garotas da minha época, em nível de alfabetização.

Agora era diferente, eu era uma estudante de verdade. Eu era colega e contemporânea de todos aqueles meninos e meninas que faziam parte da infância da minha terra, naquela época.

Lá estavam, Juca de Seu Sebastião Senhor, Nevinha de Zé Dentista, Gracinha e Edileide Patriota (sobrinhas de Dona Madá), Leninha de Seu Miguel Costa, Eduardo de Dona Joaquina, Hamilton de Seu João Ricardo, Paulo Roberto Gonçalves Lopes (sobrinho do Padre João), Luíz de Dona Carminha, José Carlos Malta, Raimundo de Seu Zé Santos, Carlos de Seu Zé Rêgo (hoje, meu marido) e tantos outros queridos e queridas amigas. Uns mais tarde, outros mais cedo, foram alunos do D. José Lopes na década de 1950, tendo a maioria deles passado pelas mãos da professora Dona Madá.

Dona Madá era irmã da professora Dona Otacília (in memoriam) que, semelhante a ela, também foi responsável pela educação de inúmeras crianças da minha terra,  naquela época.

Era irmã também dos renomados poetas, conhecidos como os irmãos Batista, Dimas, Lourival e Otacílio (in memoriam).

Lourival Batista (acompanhado de sua esposa Helena Marinho
 e o poeta Jó Patritota (in memoriam)

Otacílio e Dimas

Lourival Batista (Louro do Pajeú)

Otacílio Batista (ao centro)


Otacílio e Dimas

Dona Madá foi casada com o Ex-Prefeito de Itapetim, Simão Leite Ferreira (in memoriam).

2º prefeito eleito de Itapetim (1959-1962)

Seu Simão era um comerciante abastado. Proprietário de uma das maiores lojas de tecidos da cidade. Residiu com Dona Madá numa casa grande de 1º andar, vizinho à sua loja, onde nasceram os filhos:
Sheila (bancária aposentada do Banco do Brasil), Charles (também bancário do BB, já falecido), Shirley (promotora e justiça) e Chárliton  (poeta, professor e autor do livro  “Casebres, Castelos e Catedrais”).


Maria das Graças Patriota, Gracinha de Dona Otacília, como a chamávamos, era a sobrinha predileta de Dona Madá. Foi também a minha colega de curso primário, e a minha melhor amiga. Era neste primeiro andar que ficava o quarto que a sua tia querida, "Dadá", reservou para ela. Minha presença por ali, naquela época, era uma constante, dado esses fortes laços de amizade que nós construimos na infância e na adolescência. 

Seu Simão foi o dono do famoso caminhão, que ficou conhecido como "O Jangadeiro", do qual guardamos saudosa lembrança.


E foram essas lembranças maravilhosas, de um tempo tão saudável, de amizades tão sinceras e desprovidas de interesses, onde víviamos quase como irmãos, que me fizeram ficar muito triste quando li no Blog do Jornalista Inaldo Sampaio:


"Morreu no Hospital Esperança, no Recife, nesta segunda-feira, vítima do mal de Alzheimer, Maria Madalena Patriota Leite, popularmente conhecida como “Madá”.
Ela tinha 83 anos de idade, era natural de Itapetim e era a única irmã viva da famosa trindade de violeiros – Dimas, Lourival e Otacílio Batista.
Madalena Patriota era professora aposentada e viúva de Simão Leite, 2º prefeito eleito de Itapetim (1959-1962). O prefeito Adelmo Moura (PSB) decretou luto oficial por três dias.
Ela era mãe de quatro filhos: Sheila (bancária aposentada do Banco do Brasil), Charles (também bancário do BB, já falecido), Shirley (promotora e justiça) e Chárliton (poeta, professor e autor do livro “Casebres, Castelos e Catedrais”).
O corpo será velado em São José do Egito e o sepultamento está previsto para a manhã desta terça-feira no cemitério Campo da Saudade."

Posto aqui este vídeo, de onde extraí a sua foto, para lembrar sua fisionomia, eternizando-a  na memória da posteridade e, no coração daqueles que, como eu, tanto receberam da amada e saudosa mestra. Que Deus a receba na eternidade, permitindo-lhe a graça da salvação.



6 comentários:

Carlinda Nunes disse...

Minha querida Lusa,

Hoje no "Raizes do Coração" revivi momentos que estavam arquivados nos anais do subconsciente, através de tuas narrativas, ao falar do teu saudoso pai e de Dona Madá Patriota, cujo vídeo mexeu com minha alma. Tens uma maneira incrível de mexer no baú dos sentimentos. Fiz comentários saídos da alma, mas a inabilidade no computador me fez perdê-los, razão pela qual estou enviando este e-mail, para te dizer que quando cheguei no meu Blog "Carlinda Nunes em Brasília" na postagem "Meu doce Riacho Salgado" as lágrimas desceram, ao ouvir "Engenho Velho" e aquela montagem que só tu sabes fazer.

Tens o dom da narrativa, e arrancas com muita propriedade a vivência real dos fatos. A cada dia me surpreendes mais, com a tua semelhança com seu Toinho (teu pai), que só sabia ser "pai", não sabia o que era ser avô, nem irmão, nem tio, nem primo,queria ser o pai de todos, cuidar de todos ... E tu reuniste ser pai e mãe para passar na frente dele quanto a gratidão, o reconhecimento, o amor pela familia, o ser cabeça, o não admitir separações e indiferenças que maculem este sentimento familiar. Ele se identificava tanto contigo que dizia: "Não sei de onde esta menina veio, nem como caiu aqui em casa." Vocês dois tinham a mesma grandeza de alma e sentimentos, tupetes , força e coerência nas palavras...

Ao falar de Dona Madá, era como que tudo aquilo eu estivesse vendo, na postagem em homenagem a ela,fosse tão presente que, ao sair do computador, me senti envolta numa aragem de saudades, era como se fossem dois mundos. És uma escritora nata, devias ter feito jornalismo, televisão, pois tua comunicação é perfeita, nem sei como consegues conversar comigo, captar meus pensamentos e expressá-los como almejo. Às vezes penso que já li tudo do teu blog. Mas, quando volto lá, está tudo novo e cheio de mais histórias e complementações. Admiro tua memória, guardas tudo! Viveste profundamente teus momentos passados, assim como vives teu presente, e isto te dar, com certeza, a verdadeira dimensão de eternidade. Não digo isso como elogios baratos, mas pelo reconhecimento da grandeza, generosidade e compreensão que tens da vida e de tudo que te rodeia. Ainda estou sentindo a emoção do reconhecimento que fiz através de um comentário no "Raizes" e perdi, por inabilidade no trato com a informática. Fica com a verdadeira luz que já se faz presente em tua alma .

Abraços de Carlinda.

Geraldo Rego disse...

Lusa,

Só hoje tomei conhecimento do falecimento de Madá Patriota, por meio do comentário de Carlinda. Embora não tenha sido seu aluno, guardo dela saudosa memória desde minha adolescência em Itapetim. Senti muito sua ida que, por coincidência, foi pela mesma doença de minha meia vida. Fiquei emocionado em ver com a foto do então Grupo Escolar D. José Lopes, onde estudei o 1º ano do Curso Primário, em 1948, com a professora Anísia de Seu Juvêncio, ainda solteira, e o 4º ano do mesmo Curso, em 1951, com a professora Áurea Simões, também solteira. De ambas tive, além de um bom aprendizado, os primeiros passos de uma orientação sadia para enfrentar os desafios de um mundo desconhecido que iria enfrentar ainda jovem, com apenas 16 anos, em 1954. Delas sinto muitas saudades, mesmo sabendo que "Embora não se possa voltar atrás para se fazer um novo começo" se possível fosse "Poderia começar agora para fazer um novo fim". Cumprimento-lhe pelo seu belo comentário acerca da professora Madá, de quem foi uma aluna precoce, e dos seus coleguinhas de classe, hoje senhoras e senhores, alguns já falecidos, e quase todos vitoriosos na vida.

Com o maior afeto,

Geraldo Rego.

Eduardo Patriota disse...

Lusa! A professora Dona Madá Patriota foi uma gigante na sala de aula com os seus ensinamentos. Notava-se o seu perfeito domínio de classe, que prendia com perfeição atenção dos alunos. A sua metodologia e a sua didática dispensavam comentários. Eu, você e outros, fomos privilegiados com os seus ensinamentos. E era sim, respeitada por todos..., aprendi muito com ela. Que o Senhor a tenha em um bom lugar no Reino do Céu. Seu ex-aluno: Eduardo Patriota."

Lusa Vilar disse...

Tens razão, amigo Eduardo, foi uma excelente professora, além do domínio do conhecimaneto, tinha horror a indisciplina, a falta de modos e do cumprimento do dever. Tinha uma visão de mundo muito grande, apesar de viver naquelas brenhas tão cheia de limitações. Mas não podia ser diferente, dado ao fato de pertencer a uma família de gênios, poetas e artistas da mais alta categoria. Nasceram dotados de uma inteligência invejável. Eu também sou muito grata a ela por tudo que me ensinou, tanto na sala de aula, quanto na sua casa, onde tive o privilégio de ser assídua freqüentadora, por ser filha de um dos maiores amigos do seu esposo, o saudoso ex-prefeito de Itapetim, Simão Leite e amiga inseparável de sua sobrinha, Maria das Graças Patriota, cuja mãe, outra talentosa mestra, Dona Otacília, foi tb minha profesora. Enfim, é por tudo isso que criei o espaço "Raízes do Coração", preciso dele para extravasar as minhas emoções relativas a essa pessoas queridas que deixaram marcas indeléveis na minha vida, como também para os que continuam, junto comigo, fazendo da vida "um hino de amor". Obrigada, pela sua amizade e participação nas minhas mensagens. Abraços para vc e Duca.

Lusa Vilar disse...

Obrigada, meus amigos: Geraldo Rêgo e Carlinda, por tão importante depoimento sobre a passagem da querida mestra Dona Madá. Sei que que deixou saudades e eterna gratidão no coração de muitos itapetinenses que, como vocês, tiveram a graça de conviver com ela. Um abraço, obrigada pela participação nesse espaço dedicado a grandes amigos.

Sheila Patriota Leite disse...

Lusa,

Ficamos maravilhados e comovidos com a crônica sobre minha mãe, uma verdadeira obra-prima. Obrigada pelo tesouro, está num lugar especial nos nossos arquivos. Nenen chorou litros de mar. Que vc continue sempre bonita, carismática e inteligente. Um forte abraço!

Sheila Patriota Leite